Órgão julgador: Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média
Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006
Ementa
RECURSO – Documento:7060535 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5005763-03.2021.8.24.0167/SC DESPACHO/DECISÃO 1. Relatório CREFISA S.A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS interpôs recurso de apelação em face da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Garopaba que, proferida nos autos da ação revisional subjacente, que julgou procedentes os pedidos inaugurais formulados por D. M. R., nos seguintes termos (evento 54, DOC1): Vistos, etc. I. RELATÓRIO Trata-se de ação revisional c/c repetição de indébito c/c danos morais com pedido liminar ajuizada por D. M. R. em face de CREFISA SA CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, ambas qualificadas na inicial.
(TJSC; Processo nº 5005763-03.2021.8.24.0167; Recurso: recurso; Relator: ; Órgão julgador: Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7060535 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5005763-03.2021.8.24.0167/SC
DESPACHO/DECISÃO
1. Relatório
CREFISA S.A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS interpôs recurso de apelação em face da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Garopaba que, proferida nos autos da ação revisional subjacente, que julgou procedentes os pedidos inaugurais formulados por D. M. R., nos seguintes termos (evento 54, DOC1):
Vistos, etc.
I. RELATÓRIO
Trata-se de ação revisional c/c repetição de indébito c/c danos morais com pedido liminar ajuizada por D. M. R. em face de CREFISA SA CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, ambas qualificadas na inicial.
Alegou a autora, em suma, que pactuou diversos contratos de empréstimo pessoal com a ré, os quais foram sendo refinanciados com o passar dos anos.
Afirmou que teve seu benefício previdenciário assistencial suspenso, em 01/04/2021, pelo INSS.
Asseverou que nos contratos existem cláusulas abusivas que pretende sejam declaradas nulas, notadamente aquelas que preveem juros remuneratórios acima da média do BACEN.
Em liminar, pugnou que a ré se abstenha de incluir ou, acaso já realizada, promova a exclusão do seu nome dos cadastros de inadimplentes. Ao final, requereu requereu a revisão dos contratos, com a declaração da nulidade das cláusulas abusivas, a repetição do indébito em dobro, a descaracterização da mora, além da condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de 20 salários mínimos. Pediu também a aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor, com a inversão do ônus da prova, e a concessão da gratuidade da justiça. Fez os demais requerimentos de praxe, valorou a causa e juntou documentos (evento 1).
Recebida a inicial, foi postergada a análise do pedido liminar, visto que imprescindível a juntada dos contratos pactuados. No mais, foi deferida a gratuidade da justiça à autora e determinada a citação da parte ré (evento 4).
Citada, a requerida apresentou contestação impugnando, preliminarmente, a concessão da justiça gratuita, visto que não comprovada a hipossuficiência financeira da autora. Em prejudicial de mérito, defendeu a ocorrência da prescrição quinquenal para a revisão dos contratos. No mérito, defendeu a legalidade da contratação em relação a tudo o que a parte autora se insurgiu, requerendo a improcedência dos pedidos e a produção de provas. Juntou documentos (evento 12).
Houve réplica, oportunidade em que a autora rechaçou os argumentos da contestação e reiterou os pedidos da inicial (evento 16).
Intimada para apresentar todos os contratos (evento 21), a parte ré defendeu que não é obrigada a manter em seus arquivos os prescritos e liquidados há mais de 5 anos (evento 34).
Na decisão do evento 39 foi afastada a prejudicial de mérito alegada pela ré e determinada a sua intimação para apresentar todos os contratos entabulados entre as partes, sob pena da incidência do art. 400 do CPC. Ainda, as partes foram intimadas para especificarem as provas que pretendiam produzir.
A requerida apresentou os contratos solicitados e requereu o depoimento pessoal da requerente (evento 44).
Por sua vez, a demandante pugnou pelo julgamento antecipado da lide (evento 45).
É o breve relatório.
Decido.
II. FUNDAMENTAÇÃO
Julgamento antecipado da lide
O processo comporta julgamento antecipado, uma vez que a prova apta à comprovação dos fatos, eminentemente documental, já deveria ter instruído a inicial ou a contestação, conforme o caso (art. 434 do CPC).
Desta forma, não há necessidade de audiência de instrução e julgamento para a colheita do depoimento pessoal da parte autora.
Com efeito, a solução do feito passa unicamente pelo exame de prova documental, que possui momento oportuno para produção, mais especificamente a primeira oportunidade que couber a cada parte se manifestar nos autos (art. 434 do CPC). Por essa razão, resta autorizado o julgamento antecipado da lide, sem que se possa cogitar de cerceamento de defesa.
Nesse norte:
EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DOS EMBARGANTES-EXECUTADOS. CERCEAMENTO DE DEFESA EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DE PERÍCIA. TESE REJEITADA. FEITO QUE SE ENCONTRA INSTRUÍDO PARA O SEU DESLINDE, COM O ARCABOUÇO PROBATÓRIO NELE AMEALHADO.
O instituto do julgamento antecipado da lide não ocasiona cerceamento de defesa; ao contrário, evita a produção de atos dispensáveis para a resolução da demanda, notadamente quando o feito está instruído com documentos suficientes para o deslinde da questão (TJSC, AC 0307466-34.2017.8.24.0033, Rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 05.03.2020).
Impugnação à gratuidade da justiça
Verifica-se que a autora postulou o benefício da justiça gratuita, alegando não possuir condições de arcar com as custas e despesas processuais sem o desfalque do necessário ao sustento de sua família. Para tanto, acostou aos autos cópia do seu extrato bancário junto ao Banco do Brasil (evento 1.6).
A teor do que preceitua o Código de Processo Civil, "o juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade" (CPC, art. 99, § 2º), já que há presunção de veracidade da alegação de insuficiência de recursos de pessoas físicas (CPC, art. 99,§ 3º).
Assim, em se tratando de impugnação à concessão do benefício da gratuidade da justiça, deveria a impugnante comprovar a inexistência dos requisitos essenciais à sua concessão, o que não ocorreu no caso.
Isso porque, por mais que tenha alegado que a requerente/impugnada não é hipossuficiente, nota-se que inexiste qualquer comprovação da efetiva possibilidade daquela em arcar com as despesas processuais.
Em caso análogo, já decidiu o Tribunal Catarinense:
"APELAÇÃO CÍVEL - IMPUGNAÇÃO AO PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA - AUSÊNCIA DE PROVAS CONTUNDENTES SOBRE A CONDIÇÃO FINANCEIRA DOS IMPUGNADOS - HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO.
É dever do impugnante comprovar, de forma contundente, as possibilidades do beneficiário da assistência judiciária em arcar com as custas processuais sem prejudicar o seu sustento e o de sua família, sob pena de rejeição de seu pedido de revogação do benefício." (TJSC, AC 2005.021310-7, da Capital, rel Juiz Sérgio Izidoro Heil).
Portanto, como a impugnada comprovou documentalmente a sua hipossuficiência (evento 1.6), demonstrando que não possui condições de arcar com o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, o benefício da justiça gratuita deve ser mantido.
Portanto, rejeito a impugnação e mantenho a gratuidade da justiça deferida à parte autora.
Prejudicial de mérito - Prescrição
Em ação revisional de contrato bancário, a pretensão da repetição de indébito observa o prazo prescricional do art. 205 do Código Civil, que prevê que "a prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor", com termo inicial na última parcela do contrato. Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC). SENTENÇA DE EXTINÇÃO, EM RAZÃO DO RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.
PRESCRIÇÃO. ALEGAÇÃO FUNDADA EM RELAÇÃO AO PEDIDO DE REVISÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. AÇÃO DE CUNHO PESSOAL. INCIDÊNCIA DO PRAZO DECENÁRIO. ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. PRESTAÇÕES CONTINUADAS. TERMO INICIAL COM O VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA. PRESCRIÇÃO AFASTADA. SENTENÇA REFORMADA.
MÉRITO. CAUSA MADURA. POSSIBILIDADE DE SOLUÇÃO PELO JUÍZO AD QUEM, NA FORMA DO ARTIGO 1.013, § 3º, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
JUROS REMUNERATÓRIOS DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. UTILIZAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE JUROS DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL (BACEN) INVIÁVEL. AFERIÇÃO DA EXISTÊNCIA OU NÃO DE ABUSIVIDADE QUE DEVE OBSERVAR O LIMITE MÁXIMO ESTABELECIDO NA INSTRUÇÃO NORMATIVA DO INSS N. 28/2008 À ÉPOCA DA PACTUAÇÃO. PERCENTUAL PACTUADO QUE EXTRAPOLA ESTE LIMITE. DECOTE NECESSÁRIO.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ART. 884, DO CÓDIGO CIVIL. CABIMENTO NA FORMA SIMPLES. SENTENÇA MANTIDA.
SENTENÇA REFORMADA. SUCUMBÊNCIA REDISTRIBUÍDA. HONORÁRIOS RECURSAIS NÃO INCIDENTES. (ART. 85, § 11, CPC).
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5000067-69.2023.8.24.0052, do , rel. Antonio Augusto Baggio e Ubaldo, Primeira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 04-07-2024).
No caso, considerando a data da contratação dos contratos e o vencimento da última parcela, não há falar em prescrição.
Mérito
Aplicação do Código de Defesa do Consumidor
Em se tratando de contrato bancário, incidente o Código de Defesa do Consumidor, figurando a parte autora, pessoa física ou jurídica, como consumidora e a instituição financeira como prestadora de serviços.
O Superior :
CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. REVISÃO. IMPROCEDÊNCIA. APELO DO DEMANDANTE. JUROS REMUNERATÓRIOS. VERIFICAÇÃO DA ABUSIVIDADE QUE SE PAUTA NA TAXA MÉDIA DE MERCADO, ADMITIDA CERTA VARIAÇÃO. ORIENTAÇÃO DO STJ. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. ABUSIVIDADE EVIDENCIADA NA HIPÓTESE. REPARO DA SENTENÇA. Na esteira do entendimento delineado pelo STJ - que admite a revisão do percentual dos juros remuneratórios quando aplicável o CDC ao caso e quando exista abusividade no pacto -, esta Câmara julgadora tem admitido como parâmetro para aferir a abusividade a flexibilização da taxa de juros remuneratórios até o percentual de 10% (dez por cento) acima da taxa média divulgada pelo Banco Central. READEQUAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA, ANTE A REFORMA DA SENTENÇA. Reformada a sentença, ainda que parcialmente, é imperiosa a readequação dos ônus sucumbenciais. APELO PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000524-57.2021.8.24.0930, do , rel. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 18-05-2023).
Além disso, cabe ressaltar que o custo efetivo total (CET) não é parâmetro de comparação com a taxa média de mercado, pois engloba, além da taxa de juros, todos os demais encargos e despesas incidentes na operação, inclusive IOF, por força do disposto na Resolução n. 4.881/2020 do Conselho Monetário Nacional.
No caso, os juros remuneratórios foram assim calculados:
Número do contrato
Tipo do Contrato
Data do Contrato
Taxa média do Bacen da data do contrato
Taxa média do Bacen na data do contrato + 10%
Juros contratos
032470039558 (evento 12.4)
Empréstimo pessoal não consignado
23/09/2020
69,53% a.a. e 4,50% a.m.
76,483% a.a. e 4,95% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470036906 (evento 12.6)
Empréstimo pessoal não consignado
06/11/2019
102,31% a.a. e 6,05% a.m.
112,541% a.a. e 7,105% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470035647 (evento 12.9)
Empréstimo pessoal não consignado
02/05/2019
119,94% a.a. e 6,79% a.m.
131,934% a.a. e 7,469% a.m.
837,23 a.a. e 20,50% a.m.
032470034936 (evento 12.12)
Empréstimo pessoal não consignado
03/01/2019
116,38% a.a. e 6,64% a.m.
128,018% a.a. e 7,304% a.m.
837,23 a.a. e 20,50% a.m.
032470024659 (evento 12.15)
Empréstimo pessoal não consignado
16/08/2018
121,44% a.a. e 6,85% a.m.
133,584% a.a. e 7,535% a.m.
1026,15% a.a. e 22,36% a.m.
0324700223656 (evento 12.18)
Empréstimo pessoal não consignado
02/01/2018
122,58% a.a. e 6,89% a.m.
134,838% a.a. e 7,579% a.m.
666,69% a.a. e 18,50% a.m.
032470020639 (evento 12.20)
Empréstimo pessoal não consignado
31/07/2017
133,15% a.a. e 7,31% a.m.
146,465% a.a. e 8,041% a.m.
666,69% a.a. e 18,50% a.m.
032470019069 (evento 12.22)
Empréstimo pessoal não consignado
20/03/2017
135,03% a.a. e 7,38% a.m.
148,533% a.a. e 8,118% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470014029 (evento 44.2)
Empréstimo pessoal não consignado
05/01/2016
118,49% a.a. e 6,73% a.m.
130,339% a.a. e 7,403% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470015624 (evento 44.3)
Empréstimo pessoal não consignado
23/05/2016
129,76% a.a. e 7,18% a.m.
142,736% a.a. e 7,898% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470017581 (evento 44.4)
Empréstimo pessoal não consignado
26/10/2016
136,16% a.a. e 7,42% a.m.
149,776% a.a. e 8,162% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470000919 (evento 44.5)
Empréstimo pessoal não consignado
01/10/2012
67,93% a.a. e 4,41% a.m.
74,723% a.a. e 4,851% a.m.
407,77% a.a. e 14,50% a.m.
032470001617 (evento 44.6)
Empréstimo pessoal não consignado
15/01/2013
68,21% a.a. e 4,43% a.m.
75,031% a.a. e 4,873% a.m.
407,77% a.a. e 14,50% a.m.
032470002805 (evento 44.7)
Empréstimo pessoal não consignado
18/06/2013
72,78% a.a. e 4,66% a.m.
80,058% a.a. e 5,126% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470003845 (evento 44.8)
Empréstimo pessoal não consignado
07/10/2013
87,79% a.a. e 5,39% a.m.
96,569% a.a. e 5,929% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470005939 (evento 44.9)
Empréstimo pessoal não consignado
02/05/2014
97,43% a.a. e 5,83% a.m.
107,173% a.a. e 6,413% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470009650 (evento 44.10)
Empréstimo pessoal não consignado
09/02/2015
108,06% a.a. e 6,30% a.m.
118,866% a.a. e 6,93% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
032470011506 (evento 44.11)
Empréstimo pessoal não consignado
29/06/2015
112,56% a.a. e 6,49% a.m.
123,816% a.a. e 7,139% a.m.
987,22% a.a. e 22% a.m.
Dessa forma, os juros foram superiores a 10% da média mensal divulgada pelo Banco Central para a espécie e período de contratação, o que recomenda sua revisão.
Logo, reconheço a abusividade das taxas de juros praticadas, limitando-a à média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil (séries 20742 e 25464 - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado).
Descaracterização da mora
Reconhecida a abusividade dos juros, a mora da autora fica descaracterizada, conforme o Tema 28 do STJ.
Repetição de indébito
O valor indevidamente recebido pelo banco deve ser repetido à parte adversa, com juros e correção monetária, sob pena de enriquecimento indevido, sendo admitida a sua compensação com eventual saldo devedor.
A repetição deve ser feita de forma simples, e não em dobro, por se tratar de cobrança calcada em erro justificável, decorrente da interpretação do que se reputava contratualmente correto.
Nesse norte a jurisprudência segue:
REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CABIMENTO. EXISTÊNCIA DE ENCARGO ABUSIVO. DEVER DE PROMOVER A DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE, NA FORMA SIMPLES, DIANTE DE ENGANO JUSTIFICÁVEL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INCIDÊNCIA DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA SOBRE TAL MONTANTE. VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA (TJSC, AC 5009761-09.2019.8.24.0018, Rel. Des. Guilherme Nunes Born, j. 10-9-2020).
Danos morais
Há pedido de indenização por dano moral com base na alegação de que a instituição financeira abusou da boa-fé e, mediante ilegalidades, obteve vantagem indevida em detrimento da consumidora, eivando a contratação de cláusulas excessivamente onerosas.
Conforme a lição de Sergio Cavalieri Filho, à luz da Constituição vigente, o dano moral pode ser conceituado, em sentido estrito, como a violação do direito à dignidade. Em sentido amplo, envolve os diversos graus de violação dos direitos da personalidade, abrangendo todas as ofensas à pessoa, considerada esta em suas dimensões individual e social. Dessa forma:
[...] o mero inadimplemento contratual, mora ou prejuízo econômico não configuram, por si sós, dano moral, porque não agridem a dignidade humana. Os aborrecimentos deles decorrentes ficam subsumidos pelo dano material, salvo se os efeitos do inadimplemento contratual, por sua natureza ou gravidade, exorbitarem o aborrecimento normalmente decorrente de uma perda patrimonial e repercutirem na esfera da dignidade da vítima, quando, então, configurarão o dano moral (Programa de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 88, 90 e 94).
Eventual constatação de encargos abusivos não implica em ofensa automática à dignidade da pessoa humana, traduzindo-se em aborrecimento não indenizável.
A suposta redução do poder aquisitivo decorreu de ato da própria parte autora, que se comprometeu ao pagamento das parcelas na forma contratada, apesar de qualquer abusividade.
Além disso, a parte autora nem sequer apontou de forma concreta qualquer repercussão ou ofensa aos seus direitos de personalidade.
III. DISPOSITIVO
Na forma do art. 487, I, do CPC/2015, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos formulados na inicial movida por D. M. R. contra CREFISA SA CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS para:
a) revisar as taxas de juros remuneratórios dos contratos objetos da lide, que passarão a observar o limite das médias de juros divulgadas pelo Banco Central para o período de cada contratação mais 10%, conforme a tabela constante na fundamentação;
b) descaracterizar a mora;
c) determinar a repetição simples de eventual indébito, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC, conforme os parâmetros definidos, até a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, ou seja 29/08/2024. A partir de 30/08/2024, aplica-se o IPCA/IBGE como índice de correção monetária, e os juros de mora incidem pela variação positiva da Taxa Selic, descontado o índice de correção monetária, consoante o art. 389, parágrafo único, c/c 406 do CC/2002, incluído pela Lei n. 14.905/2024, c/c arts. 161, § 1º, do CTN, 84, I, da Lei n. 8.981/1995 e art. 13 da Lei n. 9.065/1995.
Os valores apurados deverão ser compensados/descontados de eventual saldo devedor em aberto e, caso quitados os contratos, restituídos em parcela única.
Diante da sucumbência recíproca, CONDENO a parte autora ao pagamento das despesas processuais, na proporção de 30%, assim como de honorários advocatícios, a serem pagos aos advogados da parte ré, em 10% do valor atualizado da causa. Contudo, suspendo a exigibilidade por conta da justiça gratuita deferida.
Também CONDENO a parte ré ao pagamento das despesas processuais, na proporção de 70%, assim como dos honorários advocatícios a serem pagos aos advogados da parte autora, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação (art. 86 do CPC).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se.
Opostos embargos de declaração (evento 26, EMBDECL1 e evento 59, DOC1), foram acolhidos (evento 67, DOC1):
Vistos etc.
Cuida-se de embargos de declaração em que se alega erro material na sentença indigitada, no instante em que o número do contrato está divergente do contrato apresentado no evento 12, DOC18.
Intimada, a parte embargada não se manifestou.
É o relatório.
DECIDO.
Os embargos de declaração constituem o meio idôneo a ensejar a correção de erro material, o esclarecimento de obscuridade, a resolução de contradição e o suprimento de omissão existente no veredicto. Visam, pois, à inteireza, à harmonia, à lógica e à clareza do decisum, afastando os óbices à boa compreensão e à eficaz execução do julgado.
Como os embargos de declaração possuem caráter integrativo e aclaratório, pressupõem a existência de qualquer dos defeitos previstos no art. 1.022 do CPC, quais sejam, o erro material, a obscuridade, a omissão ou a contradição, não se destinando a cassar nem a substituir a decisão impugnada em situações que não as previstas no dispositivo em comento.
Tampouco servem os embargos de declaração para rediscutir teses, subvertendo a função de recurso à Instância Superior.
É da jurisprudência:
Depreende-se do artigo 1.022, e seus incisos, do novo Código de Processo Civil, que os embargos de declaração são cabíveis quando constar, na decisão recorrida, obscuridade, contradição, omissão em ponto sobre o qual deveria ter se pronunciado o julgador, ou até mesmo as condutas descritas no artigo 489, parágrafo 1º, que configurariam a carência de fundamentação válida. Não se prestam os aclaratórios ao simples reexame de questões já analisadas, com o intuito de dar efeito infringente ao recurso (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 750635, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 5.5.2016).
Sobre o erro material, leciona a doutrina que "'consiste na dissonância flagrante entre a vontade do julgador e a sua exteriorização; num defeito mínimo de expressão, que não interfere no julgamento da causa e na ideia nele veiculada (por exemplo, 2 + 2 = 5)'. Ocorre essa modalidade de erro quando a declaração, de fato, não corresponde à vontade real do declarante. Assim, e ainda a rigor, não se enquadram nessa categoria a inobservância de regras processuais e os erros de julgamento, vale dizer, o error in procedendo e o error in iudicando. E desse modo, o NCPC, visto em sua literalidade, não teria chegado a incluir entre os casos de embargos de declaração, os chamados 'erros evidentes' , que acontecem quando o juiz, ao decidir, incorre em equívoco manifesto na análise dos fatos ou na aplicação do Direito" (Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – vol. III. Humberto Theodoro Júnior. 47. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 662).
In casu, as alegações da parte embargante legitimam a oposição de embargos de declaração, pois retratam hipótese enumerada no art. 1.022 do CPC.
Isso porque, na tabela da decisão, o número de um contrato foi digitado de forma divergente. Logo abaixo do número, erroneamente escrito, faz-se referência do evento que corresponde ao contrato (12.18), onde é possível verificar o numero corrreto, qual seja "032470022356".
Vejamos o recorte da tabela do evento 54, SENT1:
Ante o exposto, ACOLHO OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO opostos para RECONHECER o erro material da sentença e, como corolário, alterar sua fundamentação, onde consta o número 0324700223656 leia-se o número 032470022356.
No restante, fica mantida a sentença do evento evento 54, SENT1.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Aguarde-se o trânsito em julgado. Oportunamente, arquivem-se.
Interposta apelação pela instituição financeira demandada, sustenta, em síntese, que: (a) nula a sentença por ausência de fundamentação; (b) impossível a revisão de encargos voluntariamente contratados, de maneira que as cláusulas contratuais devem ser mantidas em seus exatos termos; (c) inexiste limitação legal à taxa de juros pactuada, não sendo a lei da usura aplicável às instituições financeiras, e tampouco constituindo a taxa média de mercado um teto aos juros praticados, notadamente quando a formação da taxa de juros leva em conta critérios como a natureza do crédito e o perfil do tomador; (d) incabível a repetição de indébito porque nada cobrou de ilegal da parte adversa. Pugna pelo provimento do recurso com a reforma da decisão objurgada (evento 75, DOC2).
Não foram apresentadas contrarrazões.
Ao aportar no , rel. Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 24-07-2025).
Ademais, qualquer que seja a decisão do relator, é assegurado a parte, nos termos do art. 1.021, do CPC, a interposição de agravo interno. No entanto, cumpre destacar que em eventual manejo deste recurso, "o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada" (§ 1º do art. 1.021), "[...] de forma a demonstrar que não se trata de recurso inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante, sob pena de, não o fazendo, não ter o seu agravo interno conhecido." (TJSC, Agravo Interno n. 4025718-24.2019.8.24.0000, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 13-02-2020).
Portanto, diante do exposto, afigura-se cabível o julgamento do presente reclamo, na forma do art. 932, do CPC, já que a discussão de mérito é resolvida segundo entendimento firmado pela Corte Superior em julgamento de recursos repetitivos.
2.1. Juízo de admissibilidade
Por presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.
2.2. Juízo de mérito
Ausência de fundamentação
Sustenta a instituição financeira que a sentença vergastada deveria ser considerada nula por ausência de fundamentação, já que teria sido "proferida sem fundamentação mínima e sem análise pormenorizada do caso" (evento 73, APELAÇÃO2, p. 10).
A insurgência não procede no ponto.
Tal conclusão se alcança pois a magistrada singular analisou de forma efetiva os pedidos formulados pela autora em sua petição inicial, apresentando de maneira objetiva e concreta, os fundamentos fáticos e normativos em que se amparou para reconhecer a abusividade das taxas de juros previstas nos ajustes sob litigio, bem como determinar a sua limitação.
A bem da verdade, a casa bancária tenta arguir a nulidade da sentença por ausência de fundamentação por não se conformar com o teor da decisão que reconheceu a abusividade das taxas de juros remuneratórios previstas no contrato sob revisão, em razão da comparação delas com as taxas médias divulgadas pelo Bacen para cada um dos períodos contratados.
Assim sendo, não merece acolhimento a arguição do recorrente.
Possibilidade de Revisão Contratual
Sustenta a instituição financeira recorrente, também, a legalidade da contratação e a impossibilidade de revisão contratual, devendo o contrato firmado entre as partes ser mantido em seus originais termos em respeito ao princípio do pacta sunt servanda, mormente quanto a parte adversa tinha conhecimento das cláusulas impugnadas, firmando voluntariamente os pactos, que em nada violam os ditames da legislação de regência.
Todavia, razão não assiste à recorrente em seu intento.
Os princípios da autonomia da vontade e da observância aos termos contratados não operam de maneira absoluta, podendo dar lugar à revisão contratual quando verificada relação de consumo e constatada a ilegalidade de cláusulas contratadas.
Neste sentido, é a posição firmada por esta Corte de Justiça:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATOS DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE E DEMAIS OPERAÇÕES ATRELADAS - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - PUBLICAÇÃO SOB A ÉGIDE O REGRAMENTO PROCESSUAL DE 1973 - RECUSO INTERPOSTO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. REVISÃO CONTRATUAL - POSSIBILIDADE - MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO "PACTA SUNT SERVANDA" - INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À BOA-FÉ OBJETIVA - INSURGÊNCIA INACOLHIDA NESTE PONTO. "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." (Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça). Estando a relação negocial salvaguardada pelos ditames desta norma, mitiga-se a aplicabilidade do princípio do pacta sunt servanda, viabilizando a revisão dos termos pactuados, uma vez que a alteração das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, ou até mesmo as que se tornem excessivamente onerosas em decorrência de fato superveniente à assinatura do instrumento, configura direito básico do consumidor, nos moldes do inc. V do art. 6º da Lei n. 8.078/1990. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 1000710-75.2013.8.24.0075, de Tubarão, rel. Des. Robson Luz Varella, j. 20-06-2017).
Desta feita, é possível, em tese, operar-se a revisão contratual, cujo resultado demanda averiguar-se a existência ou não, no caso concreto, de ilegalidades contratuais.
Daí porque não há como se afastar a revisão contratual sem a respectiva análise das cláusulas impugnadas.
Juros remuneratórios
No tocante à taxa de juros remuneratórios, verifica-se que o magistrado de origem promoveu a revisão das taxas previstas no contrato impugnado por considerá-las excessivamente superiores à média de mercado, determinando sua limitação à média divulgada pelo Banco Central, acrescida do percentual correspondente a uma vez e meia aquela taxa.
Quanto a esse encargo, a instituição financeira recorrente sustenta, inicialmente, a possibilidade de cobrança das taxas contratadas, alegando não haver limitação legal à taxa de juros pactuada, não sendo aplicável às instituições financeiras a Lei da Usura, bem como não constituindo a taxa média de mercado um teto para os juros praticados, mas apenas um parâmetro de aferição.
Argumenta, ainda, que as taxas contratadas não são abusivas, pois, além de não se mostrarem demasiadamente superiores às médias de mercado, consideram a natureza do crédito fornecido e o perfil do tomador, já que a concessão de crédito pessoal possui juros fixados em patamar superior a outras modalidades, especialmente quando o público-alvo da recorrente é composto por pessoas endividadas ou negativadas, o que implica maior risco e, consequentemente, maior retorno.
Acerca da limitação da taxa de juros, cumpre reconhecer que tanto o Supremo Tribunal Federal, por meio da Súmula 596, firmou entendimento no sentido de que as disposições da Lei da Usura não se aplicam às operações realizadas por instituições financeiras, quanto o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp n. 1.061.530 sob a sistemática dos recursos repetitivos, assentou que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.
É regular, portanto, a taxa de juros pactuada quando compatível com a taxa média praticada no mercado, divulgada pelo Banco Central.
Não se desconhece que toda média é composta por valores que dela discrepam para mais ou para menos, razão pela qual, por seu próprio conceito, não pode constituir um teto à taxa pactuada, servindo apenas como parâmetro de comparação. Por isso, não será abusiva a taxa que, embora superior à média, esteja inserida em patamar razoável de tolerância.
Tal variação, aliás, é da própria natureza das taxas de juros, pois como esclarece o Banco Central:
As taxas de juros apresentadas correspondem à média das taxas praticadas nas diversas operações realizadas pelas instituições financeiras, em cada modalidade. Em uma mesma modalidade, as taxas de juros podem diferir entre clientes de uma mesma instituição financeira. Taxas de juros variam de acordo com fatores diversos, tais como o valor e a qualidade das garantias apresentadas na operação, a proporção do pagamento de entrada da operação, o histórico e a situação cadastral de cada cliente, o prazo da operação, entre outros.
Diante disso, firmou o STJ entendimento segundo o qual não consideram abusivas taxas de juros que não superem demasiadamente a média praticada pelo mercado, como vale destacar de julgamento de Recurso Especial realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos:
[...]
ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada, art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. [...] (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009, grifou-se)
Sobre a matéria, porque pertinente ao caso, extrai-se do corpo do acórdão de julgamento do referido Recurso Especial o seguinte excerto:
[...]
Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional para a Selic – taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o 'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do empréstimo.
Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros.
Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro.
Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999).
As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadore, são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros).
A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade.
Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros.
A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média.
Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos. [...] (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009, grifou-se).
Ainda, firmou entendimento a Corte Superior no sentido da impossibilidade de se adotar previamente um limite estaque acima da média para se aferir a abusividade dos juros remuneratórios, devendo a análise de eventual onerosidade excessiva e discrepância em relação à média se dar a partir do contexto de cada caso, como se extrai:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. CONTRATO BANCÁRIO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 11, 489 E 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. NÃO OCORRÊNCIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CARÊNCIA DE AÇÃO. SENTENÇA COLETIVA. LIMITAÇÃO DO JUROS REMUNERATÓRIOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO, ACRESCIDA DE UM QUINTO. NÃO CABIMENTO. ORIENTAÇÃO FIRMADA NO RESP N. 1.061.530/RS. ABUSIVIDADE. AFERIÇÃO EM CADA CASO CONCRETO.
1. O acórdão recorrido analisou todas as questões necessárias ao deslinde da controvérsia, não se configurando omissão, contradição ou negativa de prestação jurisdicional.
2. De acordo com a orientação adotada no julgamento do REsp.
1.061.530/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto."
3. Prevaleceu o entendimento de que a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para o controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso. Ao contrário, a média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o São as características do caso concreto, em especial aquelas relativas à contratação do crédito, portanto, que irão definir um critério razoável de superação da taxa média de mercado, tais como perfil do tomador, garantia contratual, valor tomado, número de prestações, risco do negócio, porte da instituição financeira, tipo e aplicação do crédito.
Na espécie, o argumento utilizado pela instituição financeira ré para justificar a cobrança de taxa mais elevada do que a média em seus contratos reside no tipo de cliente com que trabalha, no caso, "negativados e inadimplentes". A considerar-se verdadeiro tal argumento, a prática de taxas de juros remuneratórios acima da média de mercado mostrar-se-ia aceitável, porém, desde que não excedida a taxa média em demasia.
A questão, então, estaria em delinear, em percentual, a faixa de variação acima da média.
Para que a situação não fique atrelada ao plano subjetivo, é necessário ponderar-se, além dos fatores usuais que cada banco utiliza na definição de suas taxas de juros, outros elementos particulares e específicos a cada situação como, por exemplo, o perfil do tomador do mútuo bancário.
Neste aspecto é que entra o cliente negativado perante os órgãos de proteção ao crédito, o qual é diferenciado em relação aos demais, em razão do maior risco de inadimplência.
Todavia, para que tal nuance seja admitida, é indispensável que seja devidamente comprovada, não bastando a mera propaganda nos meios de comunicação, mas, sim, que a parte demandada trouxesse certidões de cartório de protestos, de órgãos protetivos de crédito, dentre outros, para figurar como elementos de análise da tomadora no caso concreto.
In casu, a casa bancária asseverou que a consumidora possuía restrições cadastrais, porém não carreou aos autos qualquer elemento documental capaz de demonstrar tal circunstância, quedando-se apenas em alegações desacompanhadas de prova.
Dessa forma, não é possível aferir qual era a real situação cadastral da tomadora no momento da contratação, sendo insuficiente para justificar, por si, a elevação dos juros pactuados.
A par disso, é certo que o contrato em análise refere-se a empréstimo pessoal, modalidade que apresenta características distintas dos empréstimos consignados em folha de pagamento. Contudo, embora se reconheça tal peculiaridade, não se pode ignorar que a forma de pagamento adotada é débito em conta-corrente, coincidindo, ou quase coincidindo, os vencimentos das parcelas com a data do depósito dos proventos salariais ou previdenciários do mutuário, circunstância que, por razões evidentes, contribui para reduzir o risco de inadimplência.
No caso concreto, deve-se considerar a natureza do crédito, consistente em empréstimo pessoal sem garantias, aliado ao fato de a demandada ofertar crédito de maneira facilitada a seus clientes, não possuindo o mesmo porte de grandes instituições financeiras. Tal condição indica que o custo de captação e de suas operações é proporcionalmente maior que o das instituições já consolidadas e detentoras de fatias expressivas do mercado, especialmente os grandes bancos, aos quais a parte autora tinha livre acesso para buscar crédito.
Diante dessas características, admite-se como não abusiva, e dentro de uma margem razoável de tolerância, a estipulação de juros remuneratórios que superem em até uma vez as respectivas médias de mercado divulgadas pelo Banco Central para operações da mesma natureza à época da contratação.
Embora se utilize o patamar acima da taxa média para aferir eventual abusividade da taxa contratada, uma vez constatada a irregularidade, a limitação deve observar a própria média de mercado, conforme jurisprudência consolidada da Corte Superior.
Adentrando no caso concreto, tem-se, que, em relação ao contrato objeto dos autos, a existência de abusividade deve ser analisada a partir da comparação das taxas mensais com as médias das Séries Temporais Bacen:
Contrato nº 032890003835
Tipo de Contrato / Série: 25464 – Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres – Pessoas físicas – Crédito pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 23,50
Data do contrato: 21/10/2015
Juros BACEN na data (%): 7,16
Superou a taxa BACEN em: +228%
Contrato nº 032890002196
Tipo de Contrato / Série: 25464 – Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres – Pessoas físicas – Crédito pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 14,50
Data do contrato: 14/04/2015
Juros BACEN na data (%): 6,51
Superou a taxa BACEN em: +123%
Contrato nº 032890006181
Tipo de Contrato / Série: 25464 – Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres – Pessoas físicas – Crédito pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 28/09/2016
Juros BACEN na data (%): 7,38
Superou a taxa BACEN em: +198%
Contrato nº 032890005507
Tipo de Contrato / Série: 25464 – Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres – Pessoas físicas – Crédito pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 14/06/2016
Juros BACEN na data (%): 7,12
Superou a taxa BACEN em: +209%
Contrato nº 032890005505
Tipo de Contrato / Série: 25464 – Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres – Pessoas físicas – Crédito pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 14/06/2016
Juros BACEN na data (%): 7,12
Superou a taxa BACEN em: +209%
Contrato nº 032890003837
Tipo de Contrato / Série: 25464 – Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres – Pessoas físicas – Crédito pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 21/10/2015
Juros BACEN na data (%): 7,16
Superou a taxa BACEN em: +207%
Contrato nº 032470039558
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 23/09/2020
Juros BACEN na data (%): 4,95
Superou a taxa BACEN em: +344%
Contrato nº 032470036906
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 06/11/2019
Juros BACEN na data (%): 7,105
Superou a taxa BACEN em: +210%
Contrato nº 032470035647
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 20,50
Data do contrato: 02/05/2019
Juros BACEN na data (%): 7,469
Superou a taxa BACEN em: +174%
Contrato nº 032470034936
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 20,50
Data do contrato: 03/01/2019
Juros BACEN na data (%): 7,304
Superou a taxa BACEN em: +181%
Contrato nº 032470024659
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,36
Data do contrato: 16/08/2018
Juros BACEN na data (%): 7,535
Superou a taxa BACEN em: +197%
Contrato nº 032470022356
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 18,50
Data do contrato: 02/01/2018
Juros BACEN na data (%): 7,579
Superou a taxa BACEN em: +144%
Contrato nº 032470020639
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 18,50
Data do contrato: 31/07/2017
Juros BACEN na data (%): 8,041
Superou a taxa BACEN em: +130%
Contrato nº 032470019069
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 20/03/2017
Juros BACEN na data (%): 8,118
Superou a taxa BACEN em: +171%
Contrato nº 032470014029
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 05/01/2016
Juros BACEN na data (%): 7,403
Superou a taxa BACEN em: +197%
Contrato nº 032470015624
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 23/05/2016
Juros BACEN na data (%): 7,898
Superou a taxa BACEN em: +179%
Contrato nº 032470017581
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 26/10/2016
Juros BACEN na data (%): 8,162
Superou a taxa BACEN em: +170%
Contrato nº 032470011506
Tipo de Contrato / Série: Empréstimo pessoal não consignado
Juros pactuados ao mês (%): 22,00
Data do contrato: 29/06/2015
Juros BACEN na data (%): 7,139
Superou a taxa BACEN em: +208%
Como se observa, nos contratos firmados entre as partes, as taxas pactuadas superam de forma expressiva a média de mercado, alcançando diferenças que variam entre 123% e 344% acima da taxa média divulgada pelo Banco Central para operações da mesma natureza à época da contratação. Tal discrepância evidencia a abusividade dos valores estipulados pela instituição financeira, que não apresentou qualquer justificativa para a fixação de taxas tão superiores ao parâmetro oficial, colocando o mutuário em evidente desvantagem na relação contratual.
Reforça essa conclusão o fato de que as taxas praticadas pela própria instituição financeira integram a composição da média de mercado, influenciando-a em movimento ascendente. Logo, mesmo considerando o incremento de risco inerente ao público-alvo da recorrente, o parâmetro adotado acima da média já contempla essa variação, não havendo razão plausível para a fixação de encargos tão elevados.
É certo que, em uma sociedade regida pela livre iniciativa e pela livre concorrência, admite-se o princípio econômico segundo o qual maior risco implica maior retorno. Contudo, não há nos autos qualquer elemento que demonstre que, mesmo após a revisão, o prêmio adicional de risco exigido pela instituição financeira não estaria coberto. Tal ônus probatório incumbia à própria instituição, que detém acesso exclusivo aos seus critérios atuariais e algoritmos de cálculo de risco e retorno.
Portanto, diante da ausência de justificativa idônea e da constatação de abusividade, impõe-se a manutenção da decisão que limitou os juros à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central, acrescida do percentual tolerado pela jurisprudência. Rejeita-se, assim, o recurso da ré.
Da repetição de indébito
Alega, ainda, a instituição financeira apelante, ser incabível a repetição de indébito porque nada cobrou de ilegal da parte adversa.
Quanto à necessidade de repetição de valores à parte recorrida, razão não possui a apelante ao pleitear a respectiva exclusão.
Isto porque, mantida a sentença de primeiro grau no que tange à limitação da taxa de juros remuneratórios do contrato revisado, deve mesmo a instituição financeira promover a devolução, à parte autora, dos encargos contratuais cobrados a maior, cuja ilegalidade manteve-se reconhecida na presente decisão.
Assim, é de se negar provimento ao recurso da instituição financeira recorrente também nesse aspecto.
3. Honorários advocatícios
Por fim, com o desprovimento do recurso, imperiosa a majoração dos honorários advocatícios fixados na origem, a teor do art. 85, § 11, do CPC. Agora, fica a parte recorrente condenada ao pagamento da verba honorária advocatícia no patamar de 5% (cinco por cento) do proveito econômico alcançado.
4. Dispositivo
Ante o exposto, com fulcro no art. 932, IV, do CPC/2015 e art. 132 XV, do RITJSC, conheço e nego provimento ao recurso da parte ré, mantendo a sentença que julgou procedentes os pedidos da ação. Por conseguinte, majoro a verba honorária advocatícia a que condenada na origem, para o importe de 5% (cinco por cento) do proveito econômico alcançado.
Publique-se. Intimem-se.
assinado por LUIZ ZANELATO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7060535v4 e do código CRC b44a79cb.
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